Uma troca de casais, uma vilã invejosa e um segredo do passado. Elementos comuns às novelas costuraram o enredo de Meu Bem Querer, assinado por Ricardo Linhares. A produção da Globo completa 25 anos neste 24 de agosto de 2023.
A produção ambientada no Nordeste partia do interesse das irmãs Rebeca (Alessandra Negrini) e Lívia (Flávia Alessandra) por Antônio (Murilo Benício), afilhado do padre Ovídio (Cláudio Corrêa e Castro). O jovem se apaixona pela primeira, mas sobe ao altar com a segunda.
A união de Antônio e Lívia atormenta Juliano (Leonardo Brício), agregado do pastor Bilac (Mauro Mendonça), pai das moças. Sem esperanças após a perda da amada, ele se une a Rebeca, também desiludida.
Pares invertidos
O romance de Antônio e Rebeca explode nas ruínas de São Tomás da Beira. A fictícia cidade, próxima ao mar, foi devastada por uma onda gigante após os moradores assassinarem Frei Tomás, buscando pelo tesouro que, reza a lenda, o religioso teria escondido na igreja. Os que sobreviveram ao maremoto construíram São Tomás de Trás, lugarejo protegido por dunas e dividido entre os devotos da igreja católica, comandada por padre Ovídio, e os protestantes guiados por Bilac.
As desavenças entre os dois líderes religiosos seriam suficientes para afastar Antônio e Rebeca. O casal, porém, também é alvo da inveja de Lívia. Sentindo-se rejeitada pelo pai desde a infância – e sem nunca ter convivido com a mãe, que morreu ao dar à luz –, a caçula de Bilac se dedica às investidas no homem da irmã, desprezando o interesse de Juliano.
Lívia leva o pretenso cunhado para a cama após uma noite de bebedeira. A “desonra” implica no rompimento com o pai e na partida dela, ao lado de Antônio, para a capital. Aproveitando-se da fragilidade de Rebeca, Bilac induz o casamento dela com Juliano. Tempos depois, Lívia e Antônio – então dedicado aos estudos de Medicina – celebram a chegada do filho Júnior (Helder Agostini). Juliano e Rebeca enfrentam o parto prematuro de Ester (Camila Farias).
A infelicidade acompanha os casais durante sete anos. Cansada da vida simples que leva com o marido, e sem qualquer apreço pelo filho, Lívia abandona os dois. Ela se estabelece no Sul do país graças à venda de suas rendas de bilro. E Antônio volta à cidade onde cresceu, com Júnior a tiracolo, por conta de um triste acontecimento político e social.
A dona do jogo
Em São Tomás de Trás, Custódia Alves Serrão (Marília Pêra) é a lei. Mesmo enclausurada no casarão que pertence ao irmão Inácio (Nuno Leal Maia), desde que foi abandonada pelo noivo há 30 anos, a mandachuva oprime a população e as autoridades, como o delegado Néris (Ary Fontoura) e o vereador Barnabé de Barros (Osmar Prado).
Inácio, por sua vez, goza da simpatia dos moradores, embora se “dê ao desfrute” com Ava Maria (Angela Vieira). Mesmo casado com Verena (Lilia Cabral), que trocou o Brasil pela boa vida em Miami, o político manteve o relacionamento de décadas com a dona do salão de beleza Glamour, para tristeza de Martinho (José Mayer), amigo de Inácio e secretamente apaixonado por Ava.
Viúvo, Martinho se dedica à Casa de Pães e aos quatro filhos – Patrício (Mário Frias), Baby (Samara Felippo), Joca (Letícia Medella) e Dan (Sérgio Hondjakoff) –, criados com o auxílio da governanta Delfina (Eloísa Mafalda). Mesmo tendo alergia à política, literalmente, o padeiro aceita formar chapa com Inácio. O irmão de Custódia é eleito, mas falece logo em seguida.
O episódio transforma Martinho em prefeito, estabelece uma guerra entre Verena e a cunhada pelo patrimônio de Inácio e leva Antônio de volta à cidade, em definitivo. Com remorso pela morte do irmão por falta de socorro imediato, Custódia determina a reabertura do posto médico, empregando o afilhado de Ovídio.
Irmãos e inimigos
Juliano interpreta o retorno de Antônio como uma afronta. Além da proximidade dele e de Rebeca, contratada como enfermeira do posto de saúde, e dos primos Júnior e Ester, o fanático religioso vê na presença de um profissional da Medicina uma ameaça ao seu “dom de cura” através das mãos. A insanidade dele ganha contornos mais acentuados com o regresso de Lívia, que, após dar com os burros n’água, decide reconquistar o marido e o filho.
O que ninguém sabe, exceto Ovídio e Bilac, é que Antônio e Juliano são irmãos gêmeos. Os dois nasceram da relação de Ava e Inácio. A cabeleireira sempre afirmou ter perdido os filhos recém-nascidos em um incêndio na maternidade de Serro Azul, cidade vizinha a São Tomás de Trás, ordenado por Custódia.
“Fiquei surpresa. Pensei que a mãe fosse a Custódia. Isso dará uma mexida para a trama. Desta forma também, metade do casarão de Custódia será da viúva e a outra dos filhos de Ava com Inácio”, celebrou Angela Vieira em entrevista ao jornal O Globo.
Éder (Milton Gonçalves), que ateou fogo ao hospital, se compadeceu das crianças, batizadas por Ava como Leonardo e Murilo – uma alusão aos intérpretes dos personagens. Éder deixou Juliano no portão da casa de Bilac e Antônio aos cuidados de Ovídio, a quem confessou toda a ação.
Em determinado ponto da história, Custódia usa o crime para separar Ava e Martinho, por quem se apaixona. Ela paga uma enfermeira, Ruth (Walderez de Barros), para mentir à cabeleireira, dando conta de que um dos bebês foi salvo. Pela “informação”, Ava abandona o então noivo.
A própria vilã enfrenta um trauma relacionado à maternidade: ela perdeu o bebê que esperava de Fausto após o noivo sumir do mapa. Foi Barnabé, sempre interessado em Custódia, quem delatou o pretendente dela – um criminoso procurado no Sul do país. Tempos depois, Martinho descobre que Fausto, na verdade, está embalsamado e exposto em um quarto secreto da mansão dos Alves Serrão.
Machismo em debate
Enquanto Verena e Custódia se digladiam pela casa que fora de Inácio – aberta à visitação pública após a viúva ter sua renda confiscada pela cunhada –, Antônio e Rebeca se entregam à paixão. Juliano e Lívia, assim como fizeram no passado, delatam o casal a Bilac. O pastor reage mal ao ver a filha ainda casada nos braços do amante. Rebeca é atirada na rua pelo próprio pai. Tanto ela quanto Antônio são espinafrados pelos vizinhos.
Tal desdobramento suscitou a discussão sobre o machismo que também permeou as tramas de Ieda (Laura Cardoso) e Edivânia (Taís Araujo). Esposa do delegado Néris, Ieda padecia com as cartas anônimas que o marido recebia de uma suposta amante. Na verdade, a mulher, envolvida com um amigo de Néris, já havia falecido; Custódia enviava as correspondências ameaçadoras para manter o delegado sob seu domínio – a armação foi descoberta pelo filho e pela nora dele, Gregory (Ricardo Petraglia) e Jacira (Bia Nunnes).
Filha da ambulante Tonha da Pamonha (Arlete Salles), Edivânia pretendia ascender socialmente. O obstáculo estava na honestidade da mãe. A moça então seduziu Patrício, filho de Martinho e namorado de Lara (Carolina Abranches), herdeira de Gregory e Jacira que hesitava em entregar a virgindade para o namorado. Patrício e Lara se entenderam; Edivânia, sem saída, optou pelo aborto, mas desistiu no momento do procedimento. Ela perdeu o filho ao sofrer uma queda, na saída da clínica clandestina, e enfrentou o luto sozinha.
Em nome do povo
Tonha da Pamonha, eleita vereadora – e quase impugnada por ser analfabeta, delatada por Custódia –, é quem promove a volta de Antônio e Rebeca ao convívio dos moradores de São Tomas de Trás. Diante de uma epidemia, Tonha reabre o posto médico e conduz os dois de volta à casa de saúde com o intuito de salvar os acometidos, incluindo Custódia.
A infidelidade, porém, implica a perda das guardas de Júnior e Ester. Antônio e Rebeca até simulam um afastamento, após Lívia fingir ter tido uma noite de amor com o ex, sem sucesso.
Os conflitos se acentuam na reta final, quando, ao descobrir que estava sendo usado por Lívia mais uma vez, Juliano a violenta. Ele foge de carro logo após o crime, sofrendo um acidente que o deixa entre a vida e a morte. Acudido por Antônio, Juliano é alvo do revide de Lívia, que ateia fogo no posto de saúde, mas não consegue dar cabo do abusador.
Enquanto isso, Ava Maria busca pistas do filho em Foz do Iguaçu. E Éder, ex-marido de Tonha e executor do incêndio na maternidade, volta a São Tomás de Trás. Acuada, Custódia põe fim à vida do cúmplice.
Momentos finais
Capanga da vilã, Kajão (Roberto Bomtempo) é acusado injustamente pela morte de Éder. Revoltado, ele delata Custódia para Ava, ainda no encalço das falsas pistas sobre o filho. A história chega ao clímax quando Ovídio, livre da obrigação de manter em segredo o que ouviu de Éder no confessionário, impede Juliano de matar Antônio, revelando o laço que os une.
Juliano parte para cima do médico com uma pedra ao descobrir que ele pretende ir com Lívia para o Rio de Janeiro, evitando ficar longe do filho. Com sangue nos olhos, o fanático religioso renega o homem que o criou com uma cusparada e tenta enforcar Custódia, salva por Antônio.
A malvada, porém, não dura muito. Custódia é vítima de uma facada na calada da noite, enquanto dorme.
“Todos os ganchos são válidos: brigas, viagens, amnésia, personagem que tem segredo entrando em coma. Não tenho pudor. O mais clássico é o ‘Quem matou?’. Em ‘Meu Bem Querer’, eu já estava na reta final quando a novela foi esticada. Resolvi matar a vilã, Custódia, e investir na investigação. Sempre rende”, confidenciou Ricardo Linhares ao jornal O Globo.
No último capítulo, a revelação: Jorgete (Rosi Campos), fiel escudeira de Custódia, foi quem desferiu o golpe mortal, interessada na herança.
Outra morte é a de Lívia. Assim como a mãe, ela parte ao dar à luz Isabel, fruto da violência de Juliano, que ressurge cercado de seguidores e é encaminhado a um manicômio.
Rebeca e Antônio, enfim, se casam, assim como Ava e Martinho e Bilac e Tonha da Pamonha. Verena, por sua vez, forma trisal com Barnabé e Kajão; os três partem para Miami.
Ainda, o fim da busca pelo tesouro de Frei Tomás. Sobrinho-neto de Ieda, Pingo (Samuel Costa) encontra a fortuna, propiciando boa vida à empregada sempre humilhada por Custódia, Selma (Suzana Ribeiro), e os filhos dela, Bisteca (Carolina Pavanelli) e Tico (Yan Whately), também explorados pela malvada.
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