Direito de Amar está de volta! A novela exibida pela Globo às seis, em 1987, estreia no Canal Viva nesta segunda-feira (4), às 14h40. Assinantes do plano + canais, do Globoplay, podem conferir a trama no streaming.
Os bastidores do folhetim estrelado por Gloria Pires, Lauro Corona e Carlos Vereza foram agitados, especialmente durante a pré-produção. O site Duh Secco resgata as histórias que cercam a obra no especial abaixo.
Troca de autores
Direito de Amar atendia, a princípio, pelo título A Noiva, retirado da radionovela de Janete Clair que inspirou o enredo: A Noiva das Trevas. Em um primeiro momento, a adaptação foi entregue a Gloria Perez, tendo Marilu Saldanha como colaboradora. Deste projeto inicial, restaram apenas a participação de Marilu e a intenção de ambientar a narrativa na “belle époque” – período entre o fim do século XIX e o início do XX, marcado pela efervescência cultural e tecnológica.
Semanas após a decisão da Globo de levar “A Noiva” ao ar assim que concluísse Sinhá Moça, o roteiro passou para as mãos de Walther Negrão, com o auxílio de Marilu Saldanha e Ana Maria Moretzsohn.
“Escrevi a novela inteira, mas entrei por acaso. […] ‘Direito de Amar’ era para ser feita por outras duas autoras, mas houve uma briga nos bastidores, e me chamaram para apagar o incêndio e juntar as duas. […] Acabei substituindo uma das autoras [Ana Maria] pelo Alcides Nogueira”, contou o novelista ao site Memória Globo.
Influência
No material de divulgação da trama, replicado nos jornais da época, Negrão revelou ter a sensação de, muitas vezes, “psicografar” os capítulos, sob influência de Janete, falecida em 1983. A inspiração da “usineira dos sonhos” para a radionovela, aliás, veio de um relato de família – e ela pretendia levar o texto à TV em momento oportuno.
“‘Noiva das Trevas’ foi escrita por Janete Clair na década de 1950 e tinha apenas 12 capítulos em sua versão para o rádio. Parece que houve outra versão de 60 capítulos e, ainda, que a própria Janete chegou a fazer uma sinopse para a TV, mas trabalhamos com o primeiro material, que consistia numa história passada em 1889, ano da Proclamação da República, numa cidade do litoral baiano. Inclusive, a Janete dizia que tinha se inspirado no caso da avó de Dias Gomes, que foi dada em casamento na Bahia”, explicou Walther Negrão ao jornal O Globo.
Greve
Jayme Monjardim, recém-saído de Sinhá Moça, foi escalado para a direção geral de Direito de Amar. Em setembro de 1986, ele e o colega José Carlos Pieri iniciaram as tomadas de ambientação – conhecidas por stock shots. O elenco também estava praticamente todo escalado. Contudo, a Globo entrou em conflito com o SATED-RJ (Sindicato de Artistas e Técnica em Espetáculos de Diversões), que reivindicava melhores condições de trabalho, como carga horário de seis horas/dia.
Sem chance de contornar os problemas a curto prazo, a emissora suspendeu as filmagens de Direito de Amar e desfez os contratos por obra. Outros produtos, como a série Teletema e a minissérie O Pagador de Promessas, foram cancelados.
Enquanto buscava um acerto e a consequente retomada do folhetim, a rede de TV reapresentou Locomotivas (1977) às seis. O clássico de Cassiano Gabus Mendes disputou a vaga com Baila Comigo (1981), de Manoel Carlos.
Locomotivas perdeu boa parte da audiência conquistada por Sinhá Moça. A média geral da reprise na Grande São Paulo foi de “apenas” 27,6 pontos ante 42,9 da antecessora – um dos maiores sucessos da carreira de Benedito Ruy Barbosa.
Mudanças no elenco
Assim que entrou em entendimento com o SATED-RJ, a Globo reativou o núcleo das seis. Direito de Amar, contudo, já não podia contar com os mesmos atores e atrizes. Nair Bello, encarregada de Catarina, havia assinado com a Band para o seriado Bronco (1987), protagonizado por Ronald Golias. A personagem foi entregue a Yolanda Cardoso.
José de Abreu, comprometido com o cinema, abriu mão do Dr. Ramos. O médico foi oferecido a Rubens de Falco, então se recuperando de uma contusão numa das pernas, e Reginaldo Faria, que optou por fechar com a Manchete para Corpo Santo (1987). Carlos Zara, longe do gênero desde Champagne (1983), assumiu o papel.
Denis Derkian foi acionado para uma participação em Roda de Fogo, em exibição às oito. Com isso, Rômulo Arantes respondeu pelo boa-praça Nelo. E Emiliano Queiroz deixou Padre Inácio nas mãos de Older Cazarré.
Luz, câmera, ação!
As gravações foram disparadas, definitivamente, em novembro de 1986. As cenas do baile de máscaras que marcou o primeiro capítulo foram feitas no Palácio de Cristal, em Petrópolis, região serrana do Rio de Janeiro. Outra locação foi a Casa dos Sete Erros, também em Petrópolis, abrigo do vilão Sr. Francisco de Montserrat (Carlos Vereza).
O internato onde a protagonista Rosália (Gloria Pires) estuda, durante as primeiras semanas da história, era um imóvel do Alto da Boa Vista, também Rio.
As cenas de estúdio aconteciam na Cinédia, que abrigou uma companhia de cinema de êxito entre as décadas de 1930 e 1940. A Globo, cabe lembrar, enfrentava a superlotação de seu espaço no Jardim Botânico, resolvida apenas com a inauguração do Projac, hoje Estúdios Globo, em 1995.
Viagem no tempo
A cidade cenográfica de Direito de Amar foi construída em Guaratiba, Rio. O engenheiro Douglas de Araújo, então responsável pela divisão de cenografia, supervisionou 70 operários – de carpinteiros a aderecistas –, durante 40 dias, na construção do ambiente que remetia ao Rio de Janeiro dos idos de 1900.
A rua de paralelepípedos, na verdade, era feita de massa de cimento e areia desenhada. As mercadorias dos quiosques distribuídos pelas ruas eram de isopor. E o espectador mais atento pode notar, no Viva ou no Globoplay, que o Jornal da República trazia apenas o título e as datas da época – as notícias eram todas de 1986-87.
O espaço contava com farmácias (com ph no lugar do f) e a confeitaria de Catarina e Manel (Elias Gleizer), além de um “varal” por onde a caixa com os resultados do jogo do bicho circulava entre a pensão de Esmeralda (Cinira Camargo) e o bar.
“Foi um dos cenários mais lindos que eu já vi. Fizeram mais ou menos a Confeitaria Colombo, um luxo, uma coisa de louco”, enalteceu Elias Gleizer em depoimento ao Memória Globo.
A cidade cenográfica abrigou o clipe da música de abertura, lançado no Fantástico no domingo anterior à estreia, 15 de fevereiro de 1987. Jayme Monjardim dirigiu as filmagens com Ivan Lins cantando Iluminados, composta por ele e Vitor Martins.
Triângulo
Para atender o convite para Rosália, Gloria Pires rejeitou Glorinha da Abolição, uma das protagonistas de O Outro (1987), novela de Aguinaldo Silva transmitida às oito; Malu Mader ficou com a personagem.
“Já fiz esse tipo de moça contemporânea, moderna, liberada… Preferi a Rosália por ser uma personagem de época com toda a carga de uma heroína romântica de Janete Clair e riqueza de personalidade que se desdobram no decorrer da novela”, salientou Glorinha ao jornal O Globo.
Com o papel, a atriz repetiu o par formado por ela e o amigo Lauro Corona em Dancin’ Days (1978), Marisa e Beto. E também reencontrou o “esposo” Carlos Vereza; os dois foram casados no filme Memórias do Cárcere (1984), como Heloísa e Graciliano Ramos.
Montserrat, embora malvado, caiu nas graças do público. Algo que Negrão previu antes mesmo da exibição do primeiro capítulo, conforme entregou em entrevista ao Globo:
“Começamos a escrever a novela achando que o Montserrat era o super vilão. Mas o Carlos Vereza tem um charme enorme, uma grande empatia com o público e ficaria muito estereotipado se ele fosse apenas o bandidão. Assim, o personagem foi construído de forma que a cada 40 capítulos uma nova face dele será revelada. Ele vai se fragilizar, vai ter justificativas para suas maldades. Apesar de poderoso, ele tem seu calcanhar de Aquiles. É um vilão vivo na novela, o espírito de Janete Clair com alguma coisa de bom e, quando isso vier à tona, tudo pode acontecer”.
“Foi a novela em que eu recebi mais cartas de amor das mulheres. Era curioso, porque ele tinha uma amante. A esposa dele verdadeira era a Ítala Nandi, que ele trancava no sótão e batia”, relembrou Vereza, contemplado com o APCA de Melhor Ator pelo tipo, ao Memória Globo.
A visão do autor
Negrão buscou conexões entre o ano em que a narrativa era ambientada e o período em que ela esteve no ar às seis. A campanha de Oswaldo Cruz (Chico Tenreiro) pelo saneamento básico, em meio à luta contra a febre amarela, coincidia com o noticiário sobre o avanço da dengue no país.
Outra medida do novelista envolveu o contraste entre o Rio de Janeiro festivo, dos saraus na confeitaria de Manel, com a “ilha de ódio” em torno de Montserrat – ele, os empregados da mansão e Joana (Ítala Nandi), a “louca do sobrado”, cujo mistério em torno da verdadeira identidade perdurou durante quase todo o enredo.
Outras curiosidades
Adriano foi o primeiro protagonista de Lauro Corona em novelas. A composição do ator partiu da caracterização.
“Cortei o cabelo tipo escovinha atrás e farto na frente, como se usava na Europa retratada no filme ‘Uma Janela Para o Amor’ (1985), que vi no FestRio”, explicou ao Globo.
Narjara Turetta, a Mariana, declinou do chamado da Manchete para Mania de Querer ao aceitar Mariana, irmã das espevitadas Marinês e Marizé. Marinês foi defendida por Luiza Thiré, filha de Cecil Thiré e neta de Tônia Carrero, em seu primeiro trabalho na televisão. Marizé coube a Rosana Garcia, então ausente dos folhetins desde O Amor é Nosso! (1981).
O vestido de noiva que Rosália usa na abertura é o mesmo de seu casamento com Montserrat. A peça foi criada pelo figurinista Paulo Lois e confeccionada por Carlos Gil em tafetá de seda e renda francesa em tom amarelado, a partir de um modelo inglês.
Paulo Lois, assim como Jayme Monjardim, emendou Sinhá Moça e Direito de Amar. O lançamento desta última, aliás, coincidiu com o nascimento da filha de Jayme, Maria Fernanda. Ele já era pai do menino Jayme Matarazzo, hoje ator.
A cantora Cyda Moreira participou de um número na confeitaria. Já Margarita Schak se apresentou num recital promovido pelo vilão.
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