Quase 39 anos após a primeira e única exibição, Hipertensão está de volta! A trama de Ivani Ribeiro estreia no Globoplay Novelas – antigo Canal VIVA – nesta segunda-feira (1°). Os capítulos serão transmitidos às 13h50 e reapresentados em três faixas: 1h50, 8h50 e nas madrugadas de domingo para segunda em esquema de maratona.
Remake de Nossa Filha Gabriela (1971, Tupi), também de Ivani, Hipertensão acompanha Carina (Maria Zilda Bethlem), estrela de uma companhia de teatro mambembe. Ao desembarcar em Rio Belo, interior do Rio de Janeiro, ela é confrontada por suas origens. Três velhinhos, viúvos de trigêmeas, disputam a paternidade da atriz.
Abaixo, o site Duh Secco resgata os bastidores do folhetim.
Trio parada dura

Candidatos a pais de Carina, Candinho, Romeu e Napoleão foram interpretados por Paulo Gracindo, Ary Fontoura e Cláudio Corrêa e Castro. Este último repetiu seu papel em Nossa Filha Gabriela devido à recusa de Lima Duarte, que, ainda colhendo os louros de Roque Santeiro (1985), preferiu férias.
“Da primeira vez eu fiz a novela com muito prazer e agora faço com maior prazer ainda. Engraçado é que eu não lembro de nada, com exceção das sessões de ginástica. Sei que fez sucesso e que os outros velhos, então, eram vividos por Ivan Mesquita e Abrahão Farc”, relembrou Cláudio em entrevista ao jornal O Globo.
Caso atendesse ao chamado da autora e do diretor geral Wolf Maya, Lima repetiria as parcerias de ‘Roque’ com Paulo e Ary. Aliás, a cidade cenográfica que representava Asa Branca no clássico das oito foi transformada em Rio Belo para a trama das sete – as externas foram realizadas em Vassouras, interior do Rio, em locações como o Museu do Exército e a sede da CEDAE (Companhia Estadual de Águas e Esgotos).
Os velhinhos de Hipertensão possuíam características distintas. O esportista Napoleão prezava pela disciplina; Candinho, intelectual, era extremamente desligado. Paulo Gracindo contribuiu para o figurino de seu personagem com um adereço que incomodava sua mãe, dona Argentina, por esconder a beleza do filho.
“Era um chapéu assim que o Henry Fonda usava em seu último filme, ‘Num lago dourado’. Por isso eu o adotei. Sempre tive uma grande adoração por ele e pelo Spencer Tracy, de quem, aliás, eu seguia a escola”, contou ao Globo.
Romeu, todo ingênuo, serviu para afastar Ary Fontoura de figuras como o irritadiço Nonô Corrêa, de Amor com Amor se Paga (1984), e o medroso Florindo Abelha, de Roque Santeiro.
“Modifiquei-o à minha maneira, amenizando todas as suas reações grosseiras, de raiva e intolerância”, revelou o ator ao Globo.
Time em campo

Além de Lima Duarte, José de Abreu e Myrian Rios recusaram os convites para Hipertensão. José alegou compromissos com o cinema; Myrian optou pelo teatro.
Interessada em retomar o trabalho com Ivani Ribeiro, que deu a ela a Frosina de Amor com Amor se Paga, Berta Loran deixou o humorístico Viva o Gordo, de Jô Soares, e assumiu a personagem Gioconda. Após a leitura dos primeiros capítulos, Berta solicitou outro tipo.
“É um trabalho meio violento. Além de dar socos e muitas coisas mais, ela tem que cair no rio e eu não sei nadar. Assim, Eloísa Mafalda vai fazer o papel enquanto eu vou interpretar uma advogada”, adiantou ao jornal O Globo, às vésperas do início das gravações.
Loran ficou a ver navios, já que a tal advogada nunca entrou em cena. Eloísa brilhou como Gioconda, a despachada irmã da malvada Donana (Geórgia Gomide), a toda poderosa de Rio Belo.
A princípio, Eloísa Mafalda responderia por Odete, empregada da fazenda de Napoleão e mãe de Luzia (Cláudia Abreu, em sua estreia na TV), adolescente ludibriada por Ray (Taumaturgo Ferreira), filho de Donana. Odete acabou nas mãos de Lupe Gigliotti.
Já Ida Gomes deixou o folhetim por conta da falta de função de Ma Mére, madre superiora do colégio de freiras onde a professora Antonieta (Lilia Cabral) lecionava.
Hipertensão contou com várias participações especiais. Monique Evans, Luma de Oliveira e Sandra Bréa surgiram como candidatas ao coração de Marcos Mendonça (Carlos Eduardo Dolabella), viúvo e pai de seis filhos nada comportados – Luiza Brunet e Xuxa, já à frente do infantil Xou da Xuxa, também foram consideradas para tal núcleo. O diretor Wolf Maya apareceu como diretor de uma companhia de teatro que emprega Sandro Galhardi (Cláudio Cavalcanti).
José Mayer foi integrado ao elenco, na pele de Raul Galvão, durante a suspensão dos trabalhos da minissérie O Pagador de Promessas. Quando o projeto foi retomado, o ator se apressou em arrumar uma forma de atender às duas produções.
“As gravações devem começar em abril, mas, se anteciparem, só há uma solução: fazer o Raul de ‘Hipertensão’ viajar antes do final da novela, previsto para março. Porque longe do pagador eu não fico. É o meu grande personagem”, sentenciou Mayer em uma matéria do Globo.
Com a conclusão da novela, em abril de 87, ele seguiu para O Pagador de Promessas assim como Dolabella, Nelson Xavier (Delegado Joel) e Stenio Garcia (Chico).
Entre uma versão e outra

Durante a adaptação, Ivani Ribeiro rebatizou vários personagens. Carina atendia por Gabriela (Eva Wilma) no original – daí o título Nossa Filha Gabriela.
Em 86, a Globo também considerou relacionar o nome da protagonista ao da novela, provisoriamente chamada Caríssima. Outro título considerado foi Gosto do Prazer, por conta da música gravada pelo grupo A Cor do Som, com Gilberto Gil, para a abertura.
O escolhido, Hipertensão, indicava elevação dos conflitos propostos na narrativa a partir do convívio entre os moradores de Rio Belo e os integrantes da trupe mambembe liderada por Sandro. Nas chamadas, o texto fazia analogia ao aumento da pressão arterial – hipertensão em termos médicos –, com cenas dos velhinhos Napoleão, Candinho e Romeu se exercitando.
Outros nomes atribuídos por Ivani na primeira versão, como Donana (então Lélia Abramo), foram mantidos. O mesmo para Sérgio (Fausto Rocha Jr em 71), depois trocado por Ray, a pedido de Taumaturgo Ferreira, conforme relatado pelo próprio ao Globo:
“Acho este nome mais sonoro. Ray está bem de acordo com esse rapaz que não tem muito a ver com Rio Belo, porque ficou muitos anos no Rio e pensa e se veste de forma arrojada”.
Mais adiante, um “novo Sérgio” pintou no enredo. Marcos Wainberg ficou encarregado do tipo, gerente de vendas de uma grande loja que desembarca na cidadezinha do interior ao lado da namorada, a moderníssima Beatriz (Lúcia Alves).
Baixou enfermaria

Ao longo das gravações, vários talentos enfrentaram perrengues. Maria Zilda Bethlem sofreu com uma pneumonia logo no início dos trabalhos. Elizabeth Savala, a Renata, enfrentou o mesmo problema na reta final.
Paulo Gracindo se ausentou dos estúdios para realizar a correção da catarata. A autora aproveitou a licença médica pra introduzir mais um mistério na trama, o do desaparecimento de Candinho, localizado, sem memória, numa pensão para mulheres.
Cesar Filho, o Túlio, enfrentou um acidente automobilístico, sem gravidade, quando voltava das gravações na cidade cenográfica construída em Guaratiba, zona oeste do Rio de Janeiro.
Contém spoilers!

Durante os 167 capítulos, Carina enfrentou várias provações. Um desafio e tanto para a protagonista Maria Zilda, que emendou Selva de Pedra, às oito, em Hipertensão. Em determinado momento, Carina perde a visão, o que levou Zilda a adaptar sua forma de atuar.
“Quando o ator está em cena, ele ao mesmo tempo se mantém alerta para a técnica de televisão. Fica sacando a luz, percebendo quando ela está acesa ou apagada e a gravação começa e termina, vai percebendo as coisas ao redor. Mas a partir do momento em que a Carina fica cega, eu tive que apagar em mim a sensação de visão. Essa coisa de estar com os olhos abertos, mas tentar não enxergar mesmo. Aí é preciso fazer o olho não parar em objeto nenhum, manter o olhar fixo e não trocar esse ponto por outro, não perceber o objeto, o móvel, o estampado da colcha. Uma coisa muito doida”, analisou a atriz em entrevista ao jornal O Globo.
Apaixonada por Túlio, o que a impedia de notar o amor de Sandro, Carina enfrentou o assédio de Ray, entrando em rota de colisão com a vilã Donana. Foi esta, aliás, a responsável por afastar a heroína do pai, após a morte da mãe e das irmãs destas – Maria Clara, Maria Luísa e Maria Teresa – num hospital de uma aldeia italiana, vítimas da máfia. Donana, que estava na unidade de saúde para tratar do vício em álcool, recebeu a certidão de nascimento da criança das mãos da mãe de Carina; no caso, a trigêmea casada com Romeu. Ela descobriu a verdade quando cogitou comprar a fazenda dos velhinhos, usando o documento como moeda de troca.
A paixão de Ray por Carina levou Luzia à loucura. Enciumada, a garota passou a confrontar o rapaz, o que incomodou Donana. Luzia acabou assassinada na altura do capítulo 100. Por estar com uma presilha de Carina nas mãos, a culpa recaiu sobre esta. No último capítulo, Donana foi apontada como autora do crime – Cláudia Abreu gravou o flashback da morte de sua personagem enquanto rodava cenas como Zezinha, seu papel em O Outro (1987), folhetim das oito lançado enquanto Hipertensão caminhava para seu último mês de exibição.
Cabe destacar que Carina e Donana também se enfrentaram na disputa pela prefeitura de Rio Belo. A atriz acabou retirando sua candidatura, levando Marcos ao pleito – justamente o homem por Donana era secretamente apaixonada.
Fora do ar

Em Hipertensão, Ivani Ribeiro retomou a discussão de A Viagem (1975, Tupi) sobre música brasileira x música internacional – também vista na atualização que a Globo promoveu em 1994, atualmente em reprise no Vale a Pena Ver de Novo. Túlio Toledo, galã da companhia de teatro mambembe, assumiu um programa na rádio de Rio Belo e passou a dedicá-lo apenas a artistas nacionais.
Coincidência ou não, Cesar Filho, que já havia apresentado o TV Mulher e o Fantástico antes de ingressar nas novelas, foi convidado para comandar o Globo de Ouro logo após o término de Hipertensão. Ele e Isabela Garcia substituíram Lauro Corona e Myrian Rios na parada de sucessos que fez história na tela da Globo.
Apesar da defesa da música brasileira na narrativa, o repertório internacional de Hipertensão repercutiu, e muito, tornando-se a trilha sonora mais vendida do horário das sete. Foram 990.329 cópias! O nacional emplacou “apenas” 176.956.
O público também adotou Fifi, nome da personagem de Fafy Siqueira, como sinônimo de fofoqueira. A esposa do médico Victor (Ruy Rezende) vivia debruçada na janela à espera de notícias sobre os moradores de Rio Belo.
A trama ainda reverberou nos lares brasileiros graças ao visual de Carina, com roupas, adereços para os cabelos e brincos de inspiração cigana. Já a moda dos dois relógios no pulso, propagada por Laerte (Paulo Betti) – e por Helena (Mayara Magri), do folhetim das oito Roda de Fogo –, não pegou.
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